EMOÇÃO A “PALO SECO”

Textos Críticos - Artes Plásticas 

 

“Se diz a palo seco
a esse cante despido
ao cante que se canta
sob o silêncio a pino”

João Cabral de Melo Neto

 


Pintor-desenhista, Abelardo Zaluar (1924-1987) está por inteiro nesta mostra: um ás de “A” a “Z”, desenhista-pintor. Dos trabalhos iniciais, voltados para um olhar pessoal da paisagem, à precisão das formas geométricas logo adotadas e coerentemente mantidas pela vida afora. Despojamento e emoção desprendem-se desses quadros que refletem o percurso de permanente equilíbrio do artista.

Do pai, desenhista e pintor bissexto, Zaluar herdou os instrumentos de seu métier: uma pequena caixa de pintura e principalmente a técnica que ele usava para fazer as grandes superfícies coloridas de seu trabalho. A régua, o compasso, a tinta. A “secura” desses elementos básicos, tendo sempre o quadrado como suporte, como formato essencial, sugerem súbitas sinuosidades. Zaluar ousava arabescos dentro da concisão.

Arquiteto da composição, equilibrista, ele sabia como poucos dosar disciplina e liberdade. Extrair de seus “quadrados” a tensão imprescindível ao vôo: “as formas geométricas que produzo não representam um exercício puramente mental ou de adestramento repetitivo. Suas articulações surgem de vontades impregnadas de impulsos e vibrações de várias naturezas, mas testando constantemente a pintura que realizo.”

Artista com a consciência exata de seu ofício, Zaluar manteve-se atento ao presente sem isolar-se do passado. Em plena maturidade, este carioca de Niterói trouxe de Minas traços da tradição, depurando o barroco em suas linhas. Fiel ao geometrismo, mas sem ortodoxias com relação aos movimentos onde buscavam inseri-lo: concretismo, neo-concretismo, pop-art. Raros são os artistas que, como ele, conseguiram domar a emoção, domá-la a palo seco.


CCBB / Abelardo Zaluar - Retrospectiva
04 de agosto a 26 de setembro de 1993

 


Ronaldo Werneck