À SOMBRA DAS PALMEIRAS

Textos Críticos - Artes Plásticas 

 

Espanto é a palavra que melhor define a visão inicial dessas obras. Aparentemente, riscam-se os ícones essenciais da paisagem tropical, aqueles eternizados pelas palmeiras que povoam os desenhos e águas-fortes feitos no século XIX pelo alemão von Martius, extraídos de uma viagem de aventuras e inventários através de um Brasil desconhecido. Mas a história dessa exposição é também a de um grande amor por livros e palmeiras. Rebelde, inquieto, o austríaco Arnulf Rainer (Baden, 1929) é hoje o grande artista de seu país e o de maior renome internacional. Surrealista nos anos 50, ele aderiu também aos realistas fantásticos de Viena e tornou-se conhecido pela série de Übermalungen – as sobrepinturas que criou em 1953, até hoje sua marca por excelência.

Grande colecionador de livros raros, Rainer ama particularmente os ilustrados: “assim não preciso sair de casa quando quero ver uma palmeira. Os livros são meu armazém de referências, meus depósitos de imagens”. Essa exposição que o Centro Cultural Banco do Brasil tem o prazer de receber – com o co-patrocínio do Instituto Goethe e do Consulado Geral da Áustria no Rio de Janeiro – resulta de uma dessas viagens do artista dentro de sua própria casa. Um passeio proporcionado pelo fascínio das imagens realizadas pelo botânico alemão Carl F.P.von Martius em sua História Naturalis Palmarum, sobre as quais Rainer trabalha à semelhança de modernos palimpsestos.

Junto com von Spix, zoólogo alemão, Martius viajou Brasil afora entre 1817 e 1820, mapeando com raro primor nossa fauna e flora. A simples lembrança dessas palmeiras é uma forma tanto de homenageá-lo como aos 500 anos do nosso descobrimento. Essas sobrepinturas realçam as imagens primeiras, seus pontos de tensão. Com sua obra transformadora, Arnulf Rainer direciona o nosso modo de olhar e revê criativamente a história da arte: retoca/repagina/reprograma. Cabe ao espectador absorver suas sobrepinturas, sentar à sombra e melhor contemplar essas palmeiras sob a óptica de uma nova expressividade.


CCBB / Mostra Arnulf Rainer
29 de março a 07 de maio de 2000.

 

Ronaldo Werneck